José Santos Dias, médico urologista
O cancro da próstata é o tumor mais frequente nos homens dos países industrializados. Em Portugal, "estima-se que existam atualmente cerca de 110 000 homens com cancro da próstata", segundo o médico urologista José Santos Dias. A maior parte tem idade superior a 50 anos, sendo a idade média na altura do diagnóstico de 65 anos. Há, no entanto, casos em homens mais novos (cerca de 15%) quando há cancro da próstata na família.
Por ano, surgem em Portugal, entre cinco a seis mil novos casos deste tumor silencioso e muitas vezes assintomático. "Este é um dos grandes problemas", nota Santos Dias. "Na maior parte dos casos e em fases precoces da doença, o cancro da próstata é assintomático, ou seja, não causa quaisquer queixas."
É frequente que um doente com cancro de próstata procure o médico por queixas urinárias causadas pelo aumento benigno do órgão "As duas doenças geralmente coexistem, ou seja, um componente de aumento benigno, mais central, que comprime a uretra e por isso causa sintomas, e um componente maligno, mais periférico, que geralmente não causa sintomas", explica o urologista. As queixas mais frequentes relacionam-se com o facto de "urinar mais vezes, de dia, de noite, com um jacto urinário mais fraco ou mais fino, não esvaziar a bexiga, ficar a 'pingar' no final de urinar, ter vontade súbita de urinar, entre outras queixas".
Apesar do assinalável aumento de informação sobre este tipo de cancro, há ainda muitos homens que procuram o médico, já em fases mais tardias. "O homem afetado pode queixar-se de sintomas relacionados não com a próstata mas com a progressão local da doença, por exemplo com dor pélvica, perineal, com dor lombar motivada pela dilatação dos rins por compressão dos ureteres, com dor óssea pela presença de metástases ósseas" diz José Santos Dias, acrescentando que nessas situações "as possibilidades de tratar e controlar a doença são diferentes".
O diagnóstico precoce é essencial e tem contribuído para reduzir de forma significativa a taxa de mortalidade. "Na maior parte dos casos, atualmente, o diagnóstico é feito em fases em que se consegue tratar, erradicar a doença", afirma o médico. "Mesmo nos casos que progridem e ultrapassam a fase localizada ou que são diagnosticados em fases avançadas, as possibilidades de tratamento alteraram-se de forma muito significativa nos últimos anos. Por isso, enquanto que o número de novos casos por ano, no nosso país, é da ordem dos 5000-6000, o de doentes falecidos por esta doença, por ano, é de cerca de 2000", esclarece sublinhando, no entanto, que "mesmo assim, é um número obviamente esmagador, dada a elevada frequência da doença e que corresponde a cerca de 13-14% das mortes por causa oncológica)".
Fatores de Risco
Existem três fatores de risco comprovados para o cancro da próstata: a idade, a história familiar e a origem étnica.
Este é, "sem dúvida, um tumor mais frequente nas idades avançadas", refere o urologista José Santos Dias, explicando que "este facto tem a ver com a ação dos androgénios (ou seja, as hormonas masculinas), nomeadamente a testosterona. É provável que o maior tempo de exposição à testosterona possa contribuir para o maior risco de tumor em homens de idades mais avançadas, porque esta hormona contribui para a 'multiplicação' das células prostáticas".
O risco de cancro da próstata aumenta duas vezes se existir um familiar em 1.º grau (pai, irmãos, filhos) com esta doença. Risco que aumenta para cinco a onze vezes se existirem dois ou mais familiares em 1.º grau afetados.
Há cerca de 10% dos doentes que sofrem de cancro da próstata hereditário, considerado nos casos em que entre dois a três familiares desenvolvem a doença antes dos 55 anos.
Entre os fatores de risco, inclui-se também o da origem étnica, já que o cancro da próstata é mais frequente nos indivíduos de raça negra.
Riscos ligados à alimentação têm também sido apontados, não estando, contudo, provados cientificamente. "Pensa-se que as dietas ricas em gordura (sobretudo se com elevado teor de gordura animal e de gorduras não saturadas), as dietas ricas em proteínas (sobretudo se animais) e a exposição a metais pesados podem ter alguma influência no desenvolvimento deste tumor", afirma Santos Dias, adiantando que "alguns fatores dietéticos como o licopeno (presente no tomate cozido), uma dieta rica em frutas e vegetais e as vitaminas E, C e D, o zinco e o selénio foram apontados como protetores, mas os estudos não são totalmente conclusivos".
A obesidade também parece aumentar a agressividade do tumor.
Prevenção
Sabe-se que a melhor forma de prevenir as consequências da doença e a sua evolução mais grave é a sua deteção e diagnóstico precoce. Daí as recomendações das sociedades de urologia para a vigilância regular da próstata.
"O diagnóstico faz-se, numa fase inicial, de 'triagem', pela realização de uma análise ao sangue - o já conhecido PSA (Antigénio Específico da Próstata) e do toque rectal", explica o médico urologista José Santos Dias. "Com estes dois elementos, fica-se com uma noção da eventual presença de um tumor. Depois, pode ser necessário efetuar outros exames, como a ecografia da próstata e um exame que é cada vez mais frequentemente realizado, a ressonância magnética da próstata", diz. "Podem ainda ser necessários outros exames para melhor caracterizar a doença - exames mais ou menos sofisticados, desde uma TC, uma cintigrafia óssea até uma PET-CT."
Por rotina, os homens com idade superior a 50 anos deverão fazer o PSA e o toque retal todos os anos.
Além da dieta rica em frutas e vegetais e a vitamina E, há outras substâncias apontadas como preventivas como as vitaminas C e D, o zinco, minerais como o selénio e o cálcio. Os resultados dos estudos existentes, porém, ou não são conclusivos ou contrariam este aparente efeito benéfico.
Tratamento
O tratamento difere consoante o tumor tenha sido diagnosticado numa fase localizada ou numa fase mais avançada.
Se o tumor for diagnosticado precocemente, localizado ainda e apenas na próstata, podem realizar-se tratamentos com o objetivo de debelar completamente a doença: a cirurgia (aberta, laparoscópica, robótica), a braquiterapia intersticial (uma forma de radioterapia localizada da próstata, em que se colocam uns implantes, umas 'sementes' radioativas no interior da próstata) ou a radioterapia externa.
Outros tratamentos, como as terapêuticas focais ou a crioterapia podem também ser utilizadas nesta fase, em casos selecionados.
Segundo Santos Dias, "em alguns doentes é possível propor uma vigilância ativa, ou seja, uma forma de 'tratamento' em que se vigia regularmente a situação clínica, se realiza o PSA, o toque rectal e se repete a biópsia prostática com uma determinada frequência. Se a situação clínica estiver estabilizada, pode deferir-se o tratamento para fases posteriores".
No caso de o tumor se encontrar mais avançado localmente, poderá ser necessário operar de forma diferente, associar os tratamentos anteriormente referidos (por exemplo, cirurgia + radioterapia, braquiterapa + radioterapia) ou associar radioterapia a um tratamento médico (tratamento "hormonal") em que se associam medicamentos que atuam sobre a testosterona, explica o médico.
Nos casos mais avançados, pode ser necessário efetuar hormonoterapia, associar hormonoterapia a quimioterapia. Nesta fase da doença, apesar de já não ser possível eliminá-la, os avanços têm sido notáveis, considera Santos Dias, sublinhando que, atualmente, é possível, em grande parte dos doentes, manter a doença controlada durante muitos anos, com boa qualidade de vida.
Cancro do testículo
Muito mais raro, é o cancro do testículo outro tumor que afeta os homens.
Manifesta-se geralmente por um nódulo, uma massa, que se palpa no testículo. Muitas vezes, é o próprio doente que sente este nódulo, o que o leva a procurar ajuda médica
"Em alguns casos há uma dor testicular, mas este sintoma, quando surge, é geralmente ligeiro. Habitualmente não há uma dor forte e o doente queixa-se de um peso, um desconforto no escroto/testículo", esclarece o urologista José Santos Dias.
Este tipo de tumor pode afetar homens de todas as idades, mas é mais frequente entre os 15 e os 35 anos e depois mais tarde, por volta dos 50.
Na sua origem, estão frequentemente fatores congénitos como a "criptorquídia" (testículo que não desce para a bolsa escrotal, história familiar de tumor do testículo em familiares de primeiro grau (pai, irmãos), infertilidade e doenças genéticas como o síndrome de Klinefelter.
Algumas alterações hormonais e atrofia testicular foram também associadas a este tumor, bem como diversas alterações genéticas.
O tratamento passa pela cirurgia em que se remove o testículo (colocando-se geralmente uma prótese testicular. Em muitos casos e se o tumor estiver localizado, é este o único tratamento. Noutros casos, é necessário complementar a cirurgia com alguns ciclos de quimioterapia ou realizar radioterapia externa.
Para Santos Dias, este tumor "é um exemplo da notável evolução da Medicina, tendo ocorrido uma redução muito significativa da taxa de mortalidade, que era superior a 50% antes da década de 70 do século XX e atualmente é inferior a 10%, o que resulta da melhoria do diagnóstico, da existência de marcadores tumorais sensíveis e da evolução cirúrgica, da radioterapia e da quimioterapia".
Tenho Cancro. E depois? é um projeto editorial da SIC Notícias com o apoio da Médis.
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