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o difícil não era morrer, era sofrer
Hoje, quando liguei a televisão, estavam a falar do linfoma de Hodgkin. A doença gosta de jovens e apanhou-me um pouco antes do Natal de 1993, quando dei por um alto entre o ombro e a clavícula. Em Fevereiro de 1994, o médico pediu-me para suspender a vida, os planos e os sonhos. Era eu ou Hodgkin e, por uns segundos, pensei que o melhor era fugir do hospital.
Dois dias depois começava a quimioterapia e, em sete meses, iria aprender a viver como se estivesse em mar alto e agitado, com a sensação de enjoo constante a dar-me um nó ao estômago. O pior foi enfrentar o espelho do cabeleireiro e mandar para o lixo o longo cabelo escuro e brilhante. Levou um tempo até habituar-me a ter esta cara das fotografias.
Pelo caminho parti um pé e passei o Verão com a perna esquerda engessada a ler e a ver televisão, mas a quimioterapia é uma arma caprichosa. Em Agosto, começaram as dores nos braços e eu fraquejei. Lembro-me de ter escrito na espécie de diário que mantive nessa altura que o difícil não era morrer, era sofrer.
Por uma sorte qualquer, o cabelo aguentou-se, mesmo que qualquer brisa me fizesse doer o couro cabeludo, mas a cortisona tinha mudado a minha figura. A pele, que foi do moreno ao esverdeado, estava agora luzidia e inchada.
Eu aguentei, suspendi mesmo a vida e esperei. O veredicto chegou numa sexta-feira chuvosa, no fim Outubro: não havia qualquer sinal da doença. Eu chorei, festejei, pulei e nunca mais olhei para trás. Não quis saber se era normal, se tinha tido mais sorte. Tinha uma segunda oportunidade e corri para a agarrar.
Tenho Cancro. E depois? é um projeto editorial da SIC Notícias com o apoio da Médis.
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