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“Pensei que fosse uma coisa sem gravidade.”
Mário Piçarra era músico, apaixonado pela música e esta acompanhou-o, todos os dias, durante o seu internamento e os prolongados tratamentos, no IPO de Lisboa.
Já lá vão 13 anos mas ele recordava como se fosse hoje o susto que apanhou quando a médica do hospital de Cascais lhe comunicou que, no exame que fizera, tinham sido detetadas “umas células que lá não deviam estar” e o encaminhou para o Instituto Português de Oncologia (IPO).
“Pensei: ‘Estou feito!” e comecei a ver a vida a andar para atrás”.
Mário Piçarra tinha então 58 anos e não valorizou os sinais de um cancro colorretal. “Pensei que fosse uma coisa sem gravidade.” Deixou arrastar a situação e quando procurou o médico a doença já estava muito avançada.
No IPO, o discurso dos médicos, dos enfermeiros e dos auxiliares “foi sempre muito positivo”, o que ajudou a combater o medo e a angústia da ideia de morte.
O médico disse-lhe: “Vamos lá matar o bicho, vamos lá vencer isto.” E prescreveu-lhe radioterapia e quimioterapia conjuntas.
Todos os dias, de segunda a sexta-feira, durante duas horas, Mário Piçarra saía da sala da radioterapia diretamente para a de quimioterapia. “Reagi muito bem, estava com um espírito muito animado e tudo isso me encheu de esperança”.
À volta, teve sempre a sua companheira, os amigos e, claro, a música. A música a alimentar-lhe a esperança.
No IPO, o ambiente foi de “amabilidade, gentileza e cumplicidade, da parte de todos.” À volta, teve sempre a sua companheira, os amigos e, claro, a música. A música a alimentar-lhe a esperança.
No dia 7 de julho (mês sete) de 2007 foi finalmente operado. Alguns companheiros de enfermaria, também com problemas oncológicos, ajudaram-no a passar o tempo. Com dois deles, contactou regularmente nos cinco anos seguintes (“o que significa que sobreviveram”).
Recuperou devagar, mas bem. O sete tornou-se o seu número preferido. Pelo caminho de regresso a casa, quando teve alta do IPO, “até os prédios pareciam ter mais luz e mais cores”.
Mário Piçarra adaptou-se bem à nova situação de ostomizado [tinha uma abertura no abdómen, o ostoma, através da qual são eliminadas as fezes para um saco]. “Era isto ou morrer”. Manteve a vigilância médica, cada vez mais espaçada, como acontece com os doentes na mesma situação. E fazia as suas rotinas com alegria e humor.
“Quando me safei, pensei: ‘agora é que vou pôr os meus projetos de pé. Hoje é o primeiro dia do resto da minha vida. E escrevi poesia e toquei.”
Aconselhava a quem recebe um diagnóstico de cancro a “adotar uma atitude positiva dentro do possível, a confiar na ciência, nos médicos e em si próprio”, já que “a evolução da ciência médica e da tecnologia é extraordinária!”
Em vésperas de fazer o lançamento público do seu último CD, “Claridade”, Mário Piçarra citava, cantarolando Jorge Palma:
“Enquanto houver estrada para andar
A gente vai continuar
Enquanto houver ventos e mar
A gente não vai parar”
Amante da música e da vida, Mário Piçarra partiu recentemente em consequência, não do cancro, mas de outra doença súbita.
Tenho Cancro. E depois? é um projeto editorial da SIC Notícias com o apoio da Médis.
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